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Produções Jornalismo Impresso | PUC-Campinas

2016 | Jornalismo impresso - PUC-Campinas
ARTIGO DE OPINIÃO

Reforma imatura
Ana Luísa de Oliveira

Na sexta-feira (23), o governo federal publicou o texto da medida provisória (MP) sobre a reforma do ensino médio, a qual determina que apenas as disciplinas Português, Matemática e Inglês serão obrigatórias durante os três anos que compõem o período escolar em questão. As demais passam a ser optativas da metade para o fim, dependendo da área de conhecimento que o aluno deseja seguir. Porém, depois de muitas críticas de toda a sociedade a essa proposta, o Ministério da Educação (MEC) voltou atrás e decidiu manter a obrigatoriedade de artes, educação física, filosofia e sociologia até que seja concluída outra etapa da reforma.

A medida leva em consideração dois pontos absurdos. Para o primeiro deles é importante ressaltarmos a fala do presidente Michel Temer em discurso no Palácio do Planalto: “O projeto de vida do aluno será a prioridade”. Mas quem disse que, com 15, 16 e 17 anos, os adolescentes possuem um projeto de vida, se nem mesmo jovens adultos tem uma ideia fixa de qual área querem seguir? Segundo a versão mais recente do relatório “Education at a Glance”, da Organização para Cooperação do Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil está no topo do ranking em relação ao número de jovens entre 20 e 24 anos que não estão estudando. O percentual é de 75%, e entre os motivos está a dificuldade de achar uma carreira promissora e que agrade. Se a escolha de uma profissão é uma pressão muito grande para aqueles que já saíram do ensino médio, o que se dirá para quem está começando. Escolher qual área do conhecimento seguir é uma decisão além da maturidade esperada dos adolescentes dessa faixa etária, uma fase em que a mudança de opinião e personalidade é muito comum.  

O que nos leva ao segundo ponto: como os alunos escolherão uma das três áreas sem estuda-las com profundidade? A nova medida não só leva em consideração que o adolescente já possui bagagem suficiente do ensino fundamental para escolher quais matérias lhe agradam, como defende a ideia de que conhecimento demais é desnecessário. Para que estudar Matemática se você prefere Português? Com isso, com o objetivo de tornar o ensino médio mais interessante para os jovens, a reforma incorpora o discurso dos mesmos e deixa de lado questões muito importantes que refletirão no futuro acadêmico do nosso país. A longo prazo, gerará adultos sem nenhuma bagagem em outros campos do conhecimento que não aquele que escolheu aos quinze anos de idade.

Por fim, não podemos deixar de mencionar a precariedade com que a medida provisória foi feita. A educação é um dos temas mais importantes de qualquer país, e necessita de uma atenção ainda mais especial no Brasil. Portanto, qualquer mudança que envolva essa questão deve ser debatida com profundidade. Nesse ponto, concordo com o deputado Henrique Fontana (PT-RS) que afirmou a necessidade de um debate mais a fundo. Da mesma forma, o líder do PT na Câmara, Afonso Florence (BA) afirmou que o governo publicou “na canetada” uma medida provisória sem nenhum diálogo com nenhum setor da sociedade civil, o que é um absurdo e sintomático do Brasil, afinal, até mesmo a nossa República foi decidida sem a participação do povo. Ou seja: as questões que mais afetam a vida dos cidadãos brasileiros são tomadas de forma apressada e sem a consulta dos mesmos. Até quando?

Assim, a reforma é imatura nos seus objetivos e na sua concepção, pois foi feita sem se pensar realmente nas consequências. Mas ela pode, sim, amadurecer: se o governo deseja que o Ensino Médio seja mais atraente para os jovens de modo a diminuir os índices de evasão escolar, é necessário, antes de mais nada, entender as causas que geram o desinteresse, que vão muito além das disciplinas obrigatórias. Através de pesquisas e investigações, deve-se descobrir como mostrar aos adolescentes o quanto o conhecimento é importante para a vida deles, e não fazer justamente o contrário. É um trabalho minucioso, mas que, de qualquer outra forma, não terá efeito algum.
CRÔNICA

Posto, logo existo
Ana Luísa de Oliveira

Nesse ano, tive a oportunidade de ir pela primeira vez na Bienal do Livro. Como era de se esperar de qualquer amante de livros, o enorme pavilhão com suas estandes e tapete vermelho logo virou um dos meus lugares favoritos no mundo. Fiquei completamente absorvida pela mágica do lugar que parece exalar literatura em cada canto, mesmo aquela vinda de livros que eu não gosto ou não concordo (livros de Youtubers, por exemplo). A absorção foi tanta que, como sempre acontece comigo, sumi das redes sociais. Durante o evento não postei nada no Twitter, Snapchat, Facebook ou Instagram. Para ser sincera até esqueci que as tinha. Quando voltei, queria contar para todas as minhas amigas como foi. E eis que uma me pergunta: nossa, você realmente foi? Achei que tinha desistido, não vi nenhum post seu a respeito! 

Tal observação é pertinente se levarmos em consideração o mundo em que vivemos. Nele, temos o hábito de compartilhar os momentos bons da nossa vida porque achamos que só assim eles são válidos aos olhos de outros. Por exemplo, se você foi para um lugar incrível e não fez um vídeo no Snapchat com uma música de fundo você sente que não estava lá de fato. Se fosse assim nesse ano eu não teria ido para a Bienal, para a Disney ou para o Beach Park. Aliás, se fosse assim mesmo, eu provavelmente nunca teria saído de casa. Nesse mesmo mundo usamos as redes sociais para causar uma certa inveja nos outros e, dessa forma, aumentar nossa felicidade por conta de um fato. Assim, se você conseguiu um aumento no trabalho, vai se sentir ainda mais feliz quando postar sobre isso no Twitter ou Facebook. Ou se fez uma viagem incrível, ela vai valer mais a pena depois que todas as fotos estiverem devidamente postadas, curtidas e comentadas no Instagram.

Não julgo essa atitude, para falar a verdade. Afinal, quem não gosta de receber curtidas e comentários? Quem não gosta de registrar um momento muito especial para poder compartilhar a sua alegria com aqueles que estão longe? Um pouco de atenção e autopromoção não faz mal para ninguém. Mas é uma pena que algumas pessoas levem isso tão a sério a ponto da felicidade depender exclusivamente da atenção alheia. Para elas, desejo que um dia consigam se sentir tão bem em um lugar ou por causa de um acontecimento que não sintam a necessidade de compartilha-lo com ninguém a não ser com quem realmente importa.
EDITORIAL

Cultura ou crueldade?
Aline Marjorie e Ana Luísa de Oliveira

Em um mundo onde a briga pelos direitos dos animais está cada vez mais presente e ganhando cada vez mais força - o que se reflete, por exemplo, na grande quantidade de pessoas que decidem se tornar vegetarianas e veganas - nenhuma prática considerada cruel passa despercebida e sem polêmica. Recentemente, o alvo das discussões são as chamadas vaquejadas, tradição secular no Nordeste que tem origem em disputas de vaqueiros no sertão. Em eventos que costumam durar quatro dias, cavaleiros derrubam bois pelo rabo em busca de prêmios em dinheiro.

O fato é que, no dia 6 de outubro, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgou a vaquejada como uma crueldade contra os animais ao analisar a constitucionalidade de uma lei de 2013 do Ceará que reconhece a atividade como desportiva e cultural. Ponto para os defensores dos animais. Porém, na última terça-feira (1), o Senado aprovou o projeto de lei que eleva a vaquejada e o rodeio à condição de "manifestação cultural nacional. Ponto para os defensores do evento.

Podemos refletir sobre as atitudes dos nossos representantes políticos: como em meio a tanta contradição e mudanças de opinião é possível, de fato, analisar qual atitude seria correta tomar em relação às vaquejadas? Em menos de um mês, um evento considerado cruel foi eleito ao patamar de manifestação cultural. Isto é no mínimo, contraditório.

Ainda há projetos na Câmara: um projeto de lei e uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que podem definir as regras e regulamentar a vaquejada no Brasil. Enquanto a decisão não é tomada, os dois lados apresentam seus argumentos, que possuem suas validades e demonstram que o ideal seria, na verdade, encontrar um meio termo que agrade a ambos.

De um lado, os defensores dos animais afirmam com convicção que a vaquejada é uma prática cruel e que não tem nada de tradição, cultura ou esporte. A presidente da UIPA (União Internacional de Proteção Animal) Geuza Leitão apresentou a seguinte pergunta: “E mesmo se for tradição, tem que acabar. A escravidão não era tradição, cultura e não acabou?”. Segundo ela, tanto a vaquejada como o rodeio submetem os animais a um tratamento cruel, com práticas que não seriam mostradas ao público, como o corte do chifre do animal para não furar o cavalo e o montador e o cinto que aperta a virilha do boi para ele pular. Da mesma forma, em parecer na ação do SFT que derrubou a lei cearense, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, afirmou que o evento deve ser proibido por ser ofensivo aos animais e por ser dever do Estado protege-los.

Do outro lado, os amantes da vaquejada defendem sua condição de manifestação cultural nordestina e afirmam que a prática em nada machuca os bois. O deputado federal Arthur Maia (PPS-BA) afirmou que a decisão do SFT é um “ato de discriminação contra o Nordeste”, já que o Supremo permite outros esportes que usam animais, como polo, turfe e rodeio, mas não a vaquejada, que é “uma atividade de vaqueiros pobres”. Além disso, segundo o consultor jurídico da Abvaq (Associação Brasileira de Vaquejada), o advogado Henrique Carvalho, todas as questões relativa a maus-tratos aos animais foram sanadas: agora existe um protetor para evitar a fratura da cauda do boi e um colchão de areia de mais de 30 centímetros local da queda. Ele explica ainda que os bois usados em rodeios são caros e não sofrem qualquer tipo de ferimento, sob pena de prejuízo aos participantes.

Diante esses argumentos, é racional afirmar que antes da vaquejada ser elevada ao título de manifestação cultural, deveria ser investigada de perto para ter a certeza de que os eventos acontecem de forma em que os animais não fossem prejudicados. O Senado foi muito precipitado em tomar essa atitude em meio a tantas discussões de proteção dos animais.

O problema existe justamente porque, quando a discussão é se a prática machuca ou não os bois, os argumentos se anulam e, infelizmente, os reais interessados não podem nos contar o que estão sentindo. Dessa forma, é sensata a opinião do senador José Agripino (DEM-RN) que afirmou que “o que se precisa é corrigir o que ainda é feito de forma errada”. Ou seja: regulamentar as vaquejadas e planejar uma fiscalização contínua para garantir que os animais de fato não estejam sendo maltratados. Com isso, a prática continua como manifestação cultural nordestina e os defensores dos animais podem ficar mais tranquilos. Os dois lados saem ganhando. Uma solução prática, mas que, por depender de planejamento, provavelmente será descartada pelos governantes brasileiros.
REPORTAGEM

Mahamudra e "os fitness"
Ana Luísa de Oliveira

Quando se fala nas palavras “pessoas fitness”, qual a primeira coisa que vem na sua cabeça? Garanto que bate mais ou menos com a seguinte descrição: blusa apertada, legging ou short, tênis e, para as meninas, cabelo preso. Fotos no Instagram dos treinos, check-in nas principais academias da cidade e participação em todos os eventos possíveis e imagináveis relacionados a exercícios físicos.

Pois bem, essas pessoas estavam na minha frente em uma noite de quinta-feira, na Lagoa do Taquaral, para uma aula de um novo método que tinha chegado há poucos meses em terras campineiras e que eu queria fazer uma reportagem sobre. As características físicas dos indivíduos batiam exatamente com as descritas anteriormente; exceto que, ao invés de estarem pulando, correndo e se exercitando como um bom grupo de “pessoas fitness”, eles estavam deitados em colchões com os olhos fechados e formando um círculo, em uma espécie de meditação guiada por um professor. Todos em mais profundo silêncio, tentando relaxar.

No começo, achei estranho. Mas logo depois de alguns minutos, todos já estavam de pé. Começam a alongar, e aos poucos a quietude inicial dá lugar a conversas e gritos motivacionais dos professores. Agora sim: a Mahamudra tinha começado.

Mahamudra: palavra de origem indígena e que, segundo o coach (profissional especializado em treinar um cliente para determinado fim) e professor daquela aula, Rodrigo Rogério Spinoza, não possui um significado único. “Ela é definida de acordo com a relação entre mestre e aprendiz. Mas, em termos gerais, significa ‘a grande palavra’, ‘o grande objetivo’, ‘o grande motivo’”. No mundo fitness, é usada para descrever o método de treinamento praticado ao ar livre, criado pelo modelo internacional Cesar Curti, que alia diversas modalidades (yoga, crossfit, artes marciais, ginástica artística, exercícios aeróbicos, etc). A Mahamudra também define-se como uma filosofia que procura trabalhar os três pilares do ser humano (corpo, mente e espírito) ao envolver o participante com vários tipos de exercícios, de forma que ele se veja confrontado por desafios e motivado a encara-los, projetando essa motivação para outras áreas de sua vida.

O método está presente em São Paulo, Salvador e Londrina, tendo chegado em Campinas em fevereiro de 2016 e causando grande alvoroço no mundo fitness campineiro, já que sua proposta prometia ser diferente de tudo o que já existia. Dois meses depois, lá estava eu fazendo minha reportagem, mal sabendo que aquela noite iria me ensinar não só que novo método era esse, mas o que de fato fazem as “pessoas fitness” serem um grupo com características tão próprias.

Voltando à Lagoa, antes da aula, duas alunas concordaram em conversar comigo. Perguntei como o Mahamudra estava ajudando em suas vidas. A engenheira ambiental Marcela Chiodetto comemorou os 7 kilos perdidos por conta dos treinos, mas lamentou não poder participar mais. “Como é muita gente, não dá pra abrir e todo mundo fazer o quanto gostaria, até porque eles (os professores) não conseguiriam ajudar todo mundo”. Passada a palavra para a dona de casa Marta Alves Viana Silva, ela ressaltou: “Tem me ajudado muito no dia a dia, principalmente porque depois dos seus 40 anos você vai perdendo equilíbrio e força, e isso tem me ajudado a fortalecer a musculatura, os nervos, a concentração, disposição e energia”, disse. Ambas já praticavam o método há 3 meses. E não, não viam nenhum ponto negativo sobre ele.

Enquanto o alongamento se desenvolvia, a arquiteta Mayara Gonçalves Silva, que havia participado da aula anterior e ainda estava por ali, também conversou comigo. Animada por ter conseguido acabar seu treino, ela ressaltou mais benefícios da prática. “O objetivo do Mahamudra não é você vir aqui, treinar e ficar sarado, é mais do que isso, é um objetivo mental também. Essa é a diferença com outros grupos: o objetivo não é você ser o melhor, mas sim ajudar os outros integrantes. Tanto que um por todos e todos por um é o lema”. Questionada se, no meio de todos esses benefícios, ela via algo de negativo, Mayara só conseguiu pensar no fato do treino acontecer em um local público. “É bacana porque você está ao ar livre, você vê pessoas caminhando, mas tem a questão do risco de deixar o carro e as coisas aqui no banco”, disse. Mais nada? Não, mais nada.

Regra número 1 das “pessoas fitness”: nunca fale nada de negativo sobre seu treino.

Percebi que cabia a mim tirar minhas próprias conclusões. Deixei um pouco de lado as entrevistas e passei a observar o grupo. Após o alongamento, os professores começaram a orientar cada participante a seguir uma sequencia e um número diferente de exercícios. Como explica Rodrigo, “o treino é conjunto, mas é trabalhada a pessoa como indivíduo, e as intensidades são diferentes para cada aluno”. Por esse motivo, nota-se diferentes faixas etárias na mesma aula.

Duas alunas dividiam o mesmo colchão, e uma propôs que elas fizessem juntas as flexões. E começaram, contando e se motivando. Do lado, um aluno incentivava sua amiga a terminar uma sequencia. Ela sorria enquanto suava e flexionava os braços. Pensei comigo: eles de fato estão determinados a seguir o lema “um por todos e todos por um”. Mas não é possível que não exista nada de errado com esse método.  

Mas existe. Bastaram dois passos para eu encontrar o que procurava, o que estava faltando para a minha reportagem: manifestações negativas.

O desafio era fazer flexões com o braço apoiado no banco, mas uma aluna estava com dificuldades. “Sinto muito, mas não consigo”, lamentou ela. O professor Rodrigo posicionou-se ao seu lado e mostrou o jeito certo, mas não saiu de perto até que ela terminasse a sequencia inteira, mesmo com uma clara expressão de dor em seu rosto (o que rendeu também uma cara feia quando ele se afastou). Outra aluna, ao terminar sua sequencia, declarou em voz alta sua irritação: “Esse negócio de fazer exercício e sorrir está difícil. Ou faz uma coisa, ou faz outra.” Enquanto isso se desenrolava e os alunos pulavam, faziam flexões, abdominais, subiam e desciam de bancos, reclamavam, conversavam e faziam diferentes sequencias, os professores repetiam incentivos sem parar, além de supervisionar e insistir com alguns grupos específicos que queriam fazer menos repetições.  

Enquanto isso, do lado de fora, o advogado Rafael Campos de Almeida Felipe me disse que a melhor parte do seu dia é ir treinar, mas ressaltou que o pecado por excesso pode acontecer. E realmente, aconteceu: um aluno deslocou o ombro esquerdo no meio da aula. Após alguns minutos de tensão, nos quais os professores cogitaram leva-lo para o hospital, ele conseguiu colocar o ombro no lugar. “Acontece sempre, não se preocupem”, disse. E voltou a fazer as sequências. Os professores trocaram olhares, mas deixaram.

Regra número 2 das “pessoas fitness”: não existe desculpa para deixar de treinar.

Depois de um tempo, percebi que a determinação dos responsáveis pelo método Mahamudra a fazer com que os alunos completem os exercícios e de fato superem desafios é muito clara; chegando ao ponto de deixarem um aluno com problema no ombro continuar o treinamento porque ele afirmou que conseguia. Mas então, até que ponto essa determinação é algo positivo?  

Para o psicólogo do esporte, Ricardo Rossi, “talvez eles (os professores) estejam tão empolgados em passar a filosofia de ter que fazer tudo que acabam esquecendo que cada pessoa tem seu próprio limite. Isso vai muito da impulsividade de vender essa proposta e acabam não observando se a pessoa aguenta ou não, querem que ela consiga e saia de lá feliz.”, disse ele. “Algumas vezes as pessoas precisam de um empurrãozinho maior, e uma palavra motivacional pode ajuda-las a sair da zona de conforto. Mas precisa ter uma sensibilidade grande pra saber até quanto tem que falar e motivar a pessoa, e até quanto é o limite dela”, completa. Ele também elogia o método ao frisar o trabalho com diferentes tipos de exercícios. “O Mahamudra desenvolve vários estímulos pro nosso corpo. Atinge várias fibras musculares com as diferentes sequencias”. Porém, Ricardo ressalta que a propaganda em torno de um método inovador é enganosa. “Essa cultura de estar diversificando não é algo atual. Eles estão vendendo essa imagem hoje pra ser algo que chame a atenção, mas a verdade é que alternar diferentes exercícios e trabalhar o ser humano como um todo é uma prática antiga ”.

Ao final dos 70 minutos de treino, os alunos fizeram uma pequena meditação orientada pelos professores por alguns minutos. Depois, deram-se as mãos e falaram em voz alta palavras positivas que desejavam transmitir para o grupo. Gritaram o lema: “Um por todos e todos por um”. Aplaudiram. E fim da aula. Os alunos recolhem suas coisas e vão embora, a grande maioria com um sorriso no rosto.

Regra número 3 das “pessoas fitness”: independente de como foi o treino, você sempre saí feliz. Ou porque aproveitou e não vê a hora de treinar novamente... Ou porque está aliviado de não ter que passar por tudo isso nunca mais (o que provavelmente foi o caso da moça que foi forçada a terminar a sequencia de exercícios quando já estava no seu limite).  

No caso do Mahamudra, isso depende de como você encarou o ânimo, às vezes excessivo, dos professores.
REPORTAGEM

Profissão barbeira
Ana Luísa de Oliveira
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Lugar de mulher é onde ela quiser. Entre as frases que mais marcaram os últimos anos, essa é, de longe, a mais falada, divulgada e seguida por mulheres que lutam por direitos e oportunidades iguais a dos homens. Para fazer jus ao que acreditam, cada vez mais delas se arriscam e conquistam sucesso em carreiras tipicamente masculinas: motorista de ônibus, policial e ministra são alguns exemplos. Nesse contexto, podemos ver o surgimento cada vez maior de barbeiras, ou seja, mulheres que se especializam em cuidar da barba de homens.

Primeira
Em Campinas, terreno fértil para o crescimento de barbearias, a barber girl Vivian Doni ganha destaque. Ela foi a primeira mulher de Campinas e região a se arriscar nesse mundo tipicamente masculino. “Eu era cabelereira e trabalhava em salões femininos. Um dia, um amigo meu abriu uma barbearia em Campinas, uma das primeiras nesse novo estilo gourmet, e me perguntou porque eu não me arriscava a me tornar a primeira da região a trabalhar com barba”, conta Vivian. “Seria um atrativo não só para o negócio dele, mas também para atrair clientes para mim, por ser algo diferente. Então, eu topei, e estou no ramo há quase dois anos”, relembra ela.

Depois de se especializar em barba, a barbeira saiu do estabelecimento de seu amigo e foi trabalhar na Barbearia Cartola. Em um primeiro momento, a reação de seus colegas de trabalho foi negativa. “Teve, sim, uma rejeição e a dificuldade de aceitar uma mulher no meio deles. Mas eu não liguei, persisti e continuei com o meu trabalho”, afirma. “Hoje, eles me aceitam muito bem, mesmo sabendo que perderam alguns clientes por conta do diferencial do meu serviço”, completa. 

Questionado sobre esta relação, o barbeiro Victor Hugo Camine, que trabalha com Vivian desde o começo, afirmou ter sim ficado surpreso com a chegada dela. “A minha primeira reação foi de espanto, porque era algo completamente diferente. Além disso, criou-se uma atmosfera exclusivamente masculina nesse novo conceito de barbearia gourmet, e ter uma mulher trabalhando acaba quebrando um pouco isso”, explica ele. “Mas hoje eu acho muito legal o trabalho da Vivian aqui”, afirma.

Por ser uma novidade, a barber girl logo ganhou atenção das pessoas e se popularizou. “Depois que eu dei entrevista para o G1 Brasil, meninas do Brasil inteiro vieram me pedir conselho, saber como eu lido com o preconceito, enfim, bastante gente entrou em contato comigo”, conta ela.

Expansão
Após o sucesso de Vivian, outras barbearias passaram a procurar por esse serviço oferecido pelas mulheres. Joabel de Sousa Pereira, barbeiro chefe da Máfia da Navalha de Campinas, conta que eles começaram a procurar uma barber girl para compor a equipe. “Eu sabia da procura que os homens começaram a ter por barbeiras, porque eles gostam da delicadeza que elas oferecem. Além disso, a barbearia tem essa magia do cuidado com a vaidade, e para isso, precisamos de mulheres”, explica ele.

Claudineia Zuliani, que está no ramo das barbearias desde 2015, foi a escolhida para compor a equipe da Máfia. Apesar de a profissão não ser mais uma novidade e apesar de ter sido muito bem aceita pelos companheiros de trabalho, ela ouviu no começo muitos comentários preconceituosos dos clientes. “Eles chegavam na recepção e, se a balconista falava que eles podiam fazer comigo, eles diziam que preferiam fazer com um homem”, conta Cláudia. “Eu tinha que insistir, aí eles me perguntavam se eu realmente sabia fazer. Eu afirmava que sim e dizia que ia provar que mulher também sabe fazer barba”, completa.

Joabel afirma que essa desconfiança inicial acontece justamente porque as mulheres não tem barba; então, eles já deduzem que elas não sabem mexer e cuidar. “Mas quando eles viram a Cláudia trabalhando e perceberam que ela estudou e treinou para isso, eles experimentaram, adoraram e, hoje, dão mais preferência”, explica. “Ela passou confiança pra os clientes, e uma mão feminina é bem mais agradável que uma masculina”, completa.

Diferencial
“O diferencial do meu trabalho é tanto a mão mais leve para mexer na navalha quanto os detalhes: faço um acabamento melhor e não deixo nenhum pelinho de fora”, explica Vivian. “E também tem o fato de os homens gostarem de escutar a nossa opinião sobre o que as outras mulheres acham mais bonito, que conta mais do que a de outros homens”, brinca.


Cláudia também dá um toque a mais no seu trabalho. “Além da delicadeza e da percepção maior, eu faço massagem facial para eles relaxarem. É um complemento que eu achei para poder atrair mais clientes pra mim, mas independente disso, sempre faço um bom trabalho, porque a barba é tudo para alguns homens, eles tem um amor e um cuidado muito grande por ela”, ressalta.

Clientela
Todo esse cuidado gerou clientes fiéis para as barber girls. O engenheiro mecânico Renato Neto afirma que começou a ser atendido por Vivian por curiosidade. “Queria saber se ela daria conta de fazer minha barba. Fez como ninguém havia feito. O fato da mulher ser detalhista acaba trazendo mais capricho ao serviço”, afirma ele. “Eu gostei tanto do resultado que hoje saio de Itatiba para fazer a barba com a Vivian. Além de uma excelente profissional, é uma pessoa alegre, que claramente ama o que faz e está de bem com a vida. Isso é fundamental”, completa Renato.


Ciúmes
Vivian afirma que acontece, sim, um ciúmes por parte das namoradas e mulheres dos seus clientes. “Mas a gente tem que tentar lidar com isso da melhor forma possível. Eu, por exemplo, chamo elas para ficar perto e conversar comigo quando os acompanham nos finais de semana”, conta ela. “Já tiveram umas três que vieram me falar que tinham outra imagem de mim por conta das minhas fotos nas redes sociais, mas que, depois que me conhecerem, viram que eu sou gente boa”, conclui.
2017 | Edição e Produção - PUC-Campinas
2017 | Jornalismo Especializado - PUC-Campinas
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