De onde veio o Tabu da menstruação?

A cultura do patriarcado vem, até os dias atuais, deixando cicatrizes na vida de
todas as pessoas, a despeito do gênero. A dominação masculina e capitalista,
chegada às Américas através da colonização europeia, é a principal responsável,
também, pela demonização do corpo que sangra e gera vida.

Mariana Diogo, pesquisadora de Sociologia da Saúde e doutora em Sociologia na Paraíba, traz um pouco desse contexto histórico-cultural para ilustrar de onde vem o
tabu sobre aquilo que concerne à feminilidade -inclusive a menstruação.
“Antropologicamente falando, os povos pré-colombianos não possuíam esse olhar
sobre o corpo que menstrua. O tabu velado, bem como o esconder tudo que se
passa diante da saúde do corpo feminino, vieram através da ocidentalização. Aliado
a isso, estão o pensamento europeu (colonizador) e, principalmente, o pensamento
judaico-cristão”, explica a doutora em entrevista concedida à equipe do Fluxo em Pauta

Mariana conta que, na sociedade judaica, as mulheres menstruadas são proibidas
de sair ao sol e até mesmo tocar na comida, sob a lógica de estarem, durante esse
período, impuras. “As questões de impureza ligadas ao sangue ascenderam durante
a Idade Média e adentram às Américas no período Moderno, permanecendo na contemporaneidade. Esse corpo ainda é demonizado, escondido,
e não se fala disso (da menstruação) por causa de questões culturais,
advindas justamente do embranquecimento desse continente”, conclui.

Nesse contexto, surge o movimento feminista e, com ele, a luta a favor da emancipação de todas as mulheres e contra a demonização do corpo que menstrua. O movimento, hoje em dia múltiplo em suas intersecções, faz-se primordial na promoção dos debates que pretendemos promover por aqui, urgentes à sociedade. 

Assim como os estereótipos, a pobreza menstrual também é uma violência aos direitos de todes que passam pelo processo biológico em pauta e, graças ao trabalho de feministas e ativistas dos direitos humanos ao redor do globo, já existem projetos de leis que garantem a distribuição de absorvente para pessoas em situação de vulnerabilidade. Mas, será que é o suficiente? 


Por: Malu Lucena
DAR E SENTIR PRAZER ENQUANTO SANGRA NÃO É COISA DE OUTRO MUNDO.

Você, que sangra todo mês através do canal vaginal, já sentiu que isso influenciou de algum modo as suas relações sexuais, seja para o bem ou para o mal? 

Além do fator MENSTRUAR, o tabu secular que aprendemos existir sobre esse ciclo biológico natural aparece até mesmo quando estamos entre quatro paredes. Não conseguimos nos livrar das amarras advindas de construções sociais nem em nossos momentos mais íntimos, dá pra acreditar? É só fazer o teste: em uma mesa de bar, na presença de algumas pessoas que menstruam, pergunte se alguém ali já evitou ter relações porque estava “naqueles dias”. Apesar de estarmos caminhando para uma geração livre de pudor, certamente alguém responderá que sim. 

Em entrevista concedida para a equipe do Fluxo Em Pauta, a estudante de psicologia Larissa Teles, de vinte anos, relata ter passado por situações bem desagradáveis ao se relacionar com homens durante o período menstrual. “Com homem eu ficava receosa, alguns diziam que era tudo ‘ok’, mas eu sentia que eles ficavam desconfortáveis… Mesmo aqueles que topavam (ter relações durante o ciclo), dava pra perceber o desconforto, fosse por uma expressão de nojinho, ou até ao fazer de tudo para escapar do sexo oral. Já com mulheres, isso nunca foi um tabu, nenhuma delas nunca deu a mínima".

Segundo Larissa, para suas parceiras, o sangue menstrual nunca foi uma questão. “Eu não preciso me preocupar se minha parceira está com nojo do fluido natural que meu corpo está produzindo. Minha única preocupação é aproveitar o momento, sentir e gerar prazer.”, disse a jovem. 

Já para Maria Eduarda Peixoto, que teve experiências sexuais somente com homens, transar durante o ciclo só se mostrou uma questão quando o parceiro não era fixo. “Pelo contrário, dá até mais vontade! A única preocupação é na hora da sujeira, mas o disco menstrual me ajuda nisso. Para mim, sempre foi super ‘de boa’ enquanto estou namorando. Mas, já aconteceu de ficar desconfortável com pessoas que eu não tinha tanta intimidade… Já pediram para ‘esperar acabar’ (o ciclo), e eu me questionava a necessidade disso, já que é algo natural”, afirma Maria.

O fato é que no período menstrual, muitas mulheres relatam um aumento na libido. De acordo com uma pesquisa com 16 mil mulheres feita pela Inciclo, marca de coletores e discos menstruais, mais de 85% relatam maior desejo sexual durante esse período. Segundo a pesquisa, isso acontece durante a menstruação e nos dias que antecedem a ovulação. Além disso, conforme explica a obstetriz e fundadora da marca, Mariana Betioli, nessa fase o clítoris fica mais sensível aos estímulos e os hormônios sexuais estão mais acentuados, o que facilita o orgasmo feminino.

Em resumo, transar naqueles dias é muito bom, seja com quem for. Na verdade, quanto melhor informado for o seu parceiro, melhor as coisas irão fluir! 

Por: Malu Lucena
Sagrado Feminino

O Sagrado Feminino consiste em uma filosofia e práticas ancestrais que unem a mulher com a natureza. Através da conexão consigo mesma e com o mundo, ela consegue compreender os ciclos do seu corpo e, a partir daí, despertar para uma consciência emancipatória.

Mas, o que isso tem a ver com a menstruação?

Bem, já conversamos por aqui sobre como os estigmas voltados a este processo biológico possui raízes patriarcais, certo? Com as práticas relacionadas ao Sagrado Feminino, não foi e nem é diferente. Tendo em vista que tal conhecimento milenar colabora com a emancipação das mulheres de modo individual e coletivo, foi do interesse patriarcal utilizar-se de suas ferramentas para mitigar e condenar essas tradições.

Durante a Idade Média, por exemplo, era comum a presença de esculturas e estátuas de figuras femininas com as pernas abertas exibindo suas vulvas, as chamadas sheela-na-gig. Patrick K. Ford, em sua obra "Mulheres Celtas: O sexo oposto", cita uma teoria em que essas figuras seriam a representação de Morrigan, uma suposta deusa da guerra cujos lábios genitais "passavam dos joelhos", segundo o autor.

Ou seja, originalmente na história da humanidade, não só a vulva era celebrada, mas também a figura feminina e os processos naturais relacionados à ela; dentre eles, claro, a menstruação.

Rituais sagrados que entrelaçam a natureza (a terra e as fases da Lua) com o sangue menstrual são realizados até hoje. Acredita-se que o polêmico ato de "plantar a Lua", iniciado desde a era paleolítica, purifica e renova as mulheres para o novo ciclo lunar (menstrual) que se iniciará.

Nessa perspectiva, pensar e exercitar o Sagrado Feminino é muito importante. Através dele, conseguimos nos reconectar com a nossa consciência, ancestralidade e com o espaço que ocupamos. Dessa forma, passamos a aceitar e atribuir significados positivos aos ciclos naturais que perpassam nossa existência.

Sangrar não é feio nem nojento, pelo contrário. E, apesar de alguns percalços no meio do processo, como as dores abdominais e oscilações de humor, nós podemos subverter a lógica instaurada e e transformar a menstruação em algo libertador.

Por: Malu Lucena
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